Ciça – Queria puxar uma discussão que apenas na superfície pode parecer banal. Ouvimos muitas vezes o mercado falar de Branding como sinônimo de design. Até briefings trazem muitas vezes esses conceitos como intercambiáveis. O que acham disso?
Edu: Não é uma discussão banal não. Esse é um problema bem sério que vemos no mercado. No fundo, design é uma forma de linguagem, que por sua vez é útil para comunicar algo.
Engraçado que as pessoas não parecem desenvolver uma identidade verbal (tom de voz) sem uma estratégia. Mas acham que podem fazer isso com a identidade visual.
Identidade visual precisar ser um veículo que ajude a posicionar uma empresa, ela deve estar a serviço da estratégia.
Essa confusão é um problema com raízes bem profundas, começando pelo fato que não existe formação em branding, apenas pós graduações. Então as pessoas não começam sua carreiras a partir da estratégia, mas acabam percebendo a importância dela depois de formados – ou não. Eu sou uma dessas pessoas, comecei a trabalhar com identidade visual muito antes de saber o que era branding. A medida que fui aprendendo sua importância fui querendo estudar mais para ser um melhor diretor de arte. Acabou que achei a estratégia tão mais importante e desafiadora que o design que migrei de área.
Mas hoje tem mais cursos, como o nosso, que podem difundir o conhecimento para mais pessoas. Antes era um conhecimento para poucas pessoas.
Correlacionado a esta ideia, tem uma coisa que Jaime sempre comenta: o risco dos táticos no poder. Isto é, pessoas despreparadas para os cargos que ocupam e que por isso, têm um descompromisso com o planejamento. A pressão por resultado a curto prazo também colabora para que as empresas saiam fazendo, sem pesquisar, sem planejar, pensando mais nas vendas do mês e menos em construção de valor a longo prazo.
Um fator bem anterior a tudo isso e que colabora bastante para essa confusão, e para supervalorização do design, é que grande parte da atenção de nosso córtex, cerca de 60%, é reservado para a visão. Esse é um sentido muito importante para nossa percepção do mundo, então as pessoas acabam prestando mais atenção (conscientemente) nesta parte das marcas, mas não se dão conta de como seus outros sentidos ajudam a formar a percepção do mundo.
Vivian: Eu acho super relevante essa discussão. Na minha opinião um não devia existir sem o outro, e como o Edu mencionou acima, eu também fui para faculdade de design, sem saber o que era Branding. Depois que cheguei no mercado de trabalho, também não falava-se em Branding, um termo que fui conhecer bem depois, assim como o Design Thinking, mais para frente ainda. E para mim a palavra Branding está associada diretamente a posicionamento.
E o Design é a tradução visual do posicionamento, junto com tom de voz, e as demais vertentes do branding. Eu trabalhava intuitivamente este processo de branding, lendo, estudando, para melhorar meu discurso de defesa. Mas tudo ficou muito claro depois que fiz o curso de vocês e comecei a trabalhar junto. Vi que tem pessoas de outras áreas, com um conhecimento diferente e complementar ao meu. Não consigo mais me imaginar criando sem posicionamento definido, porém meus clientes são pequenos e médios, não sei como convencê-los a dar o passo inicial com o Branding. O que acontece também vir um briefing querendo fazer Branding, mas muitas vezes eles não sabem onde começa um e termina o outro. O que está incluso ou não. Enfim já vi de tudo, podemos fazer uma reunião para discutirmos mais.
Jaime: – Há algumas semanas, a Cecília e eu fomos a uma festa. Casa de alguns amigos, mas onde haveríamos de encontrar muito mais gente. Pessoas conhecidas nossas e outras que não saberia quem são. Eu me arrumei meio às pressas e esperei a Cecília terminar de se aprontar. Passaram-se vários minutos, vários mesmo. Depois do décimo quinto minuto, resolvi lembrá-la do horário. E de longe ouvi um: já vou!
Quando ela apareceu, lindamente vestida e maquiada, eu entendi a demora e disse isso a ela. Com o que, ela retrucou: não entendeu não! E eu: como não?
E a explicação foi inesquecível: “Jaime, você sabe como no escritório a gente faz quando está metido num projeto de brand design, não sabe? A gente sempre se cerca de informações sobre qual é a ´festa´ em que a marca vai aparecer, confere? Além, é lógico, de garantir que estamos expondo a nossa própria personalidade. Pois bem…”
Não precisou nem acabar a frase. E com serenidade, eu compreendi que não tinha havido demora alguma ao esperá-la.
Ficou flutuando no ar a frase, que nenhum de nós pronunciou, mas ambos sentimos: design é como a roupa que você usa para ir à festa.
Eu voltei para o quarto e me arrumei e novo.
Ciça: Por essa eu não esperava!!! Agradeço os elogios, Jaime =). Além disso, a festa (pré pandemia, para deixar claro) foi muito boa!.
Concordo demais com o que vocês falaram, saber qual é a festa, como disse o Jaime, a interdependência entre a promessa da marca ao mercado (seu posicionamento) e a identidade visual, como Vivian bem lembrou e essa preponderância da visão, na colocação do Edu. Mas algo que alinhava tudo o que vocês falaram é que tanto Branding quanto o Design existem para pessoas. Nunca podemos perder de vista o humano e futuro comprador/usuário que irá se relacionar com ela. O Branding e o Design precisam olhar nos olhos do consumidor, vestir seus sapatos, respirar o ar que eles respiram, viver a experiência com o coração de quem será o verdadeiro dono das marcas. Sem isso, tanto Branding quanto Design são puro devaneio de profissionais técnicos ensimesmados. Tudo começa com gostar de gente e disso a gente entende, certo, Jaime, Edu e Vivian?
Cecilia Russo Troiano
Diretora TroianoBranding, Psicóloga, Mestre em Gênero.
Eduardo Araujo
Gerente de Estratégia, Designer de Produto,
Jaime Troiano
Presidente, Engenheiro Químico, Sociólogo.
Vivian Amaral
Head de Design, Designer Gráfica.